Multas aplicadas por condomínio são anuladas judicialmente

Todas as multas de uma das 990 unidades do Condomínio Parque do Sol foram anuladas judicialmente. A sentença foi proferida nos autos do processo nº 1022780-26.2020.8.26.0224.

O condomínio, localizado em Guarulhos/SP, alegou na defesa que não seria necessário comunicar os moradores a respeito das sanções e insistiu que a vaga de carga e descarga foi utilizada de forma indevida.

O juízo da 7ª Vara Cível de Guarulhos indeferiu, a princípio, o pedido liminar para suspender a cobrança das infrações, por não vislumbrar a presença dos requisitos legais. O artigo 300, caput, do CPC, dispõe que a tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

Todavia, ao final, o juiz Domício W. Pacheco e Silva concluiu que, antes da aplicação das multas, os condôminos deveriam ter sido notificados. Por isso, as sete multas foram afastadas, no total de R$ 3.642,28.

Multas indevidas do condomínio

Os autores da ação foram surpreendidos nos meses de junho e julho de 2020, em meio à pandemia, com a cobrança de sete multas sucessivas, emitidas pelo condomínio onde residem, sem o recebimento de qualquer notificação prévia ou informações mínimas. No boleto da mensalidade condominial constava apenas que as multas estavam relacionadas ao estacionamento.

Dessa forma, os condôminos distribuíram ação para anular as multas, sob o argumento de que padeciam de vários vícios formais, que impediram até mesmo a defesa no momento apropriado.

A jurisprudência pacífica dos tribunais assinala que deve ser oportunizada a defesa antes da aplicação da sanção, e não depois, a fim de resguardar os direitos fundamentais constitucionais da ampla defesa e do contraditório.

O próprio regulamento interno do condomínio prevê a advertência por escrito, antes de efetuar a cobrança da multa.

Além de não comprovar que os moradores estacionaram o veículo indevidamente, o condomínio não demonstrou que os condôminos foram notificados. A propósito, as placas afixadas para o uso das vagas também apontam um tempo máximo de permanência diverso daquele que foi estabelecido no regulamento interno.

As partes poderão ainda interpor recursos contra a sentença.

Eficácia horizontal dos direitos fundamentais

A Corte Suprema consolidou o entendimento de que os direitos fundamentais não ocorrem somente no âmbito das relações entre o cidadão e o Estado (RE 201.819-8/RJ). Trata-se da teoria chamada de “eficácia horizontal dos direitos fundamentais” ou “eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas”.

Nesse sentido, o STJ assentou que os direitos fundamentais se aplicam nas relações condominiais (REsp 1.365.279/SP):

Por se tratar de punição imputada por conduta contrária ao direito, na esteira da visão civil-constitucional do sistema, deve-se reconhecer a aplicação imediata dos princípios que protegem a pessoa humana nas relações entre particulares, a reconhecida eficácia horizontal dos direitos fundamentais que, também, deve incidir nas relações condominiais, para assegurar, na medida do possível, a ampla defesa e o contraditório. Com efeito, buscando concretizar a dignidade da pessoa humana nas relações privadas, a Constituição Federal, como vértice axiológico de todo o ordenamento, irradiou a incidência dos direitos fundamentais também nas relações particulares, emprestando máximo efeito aos valores constitucionais. Precedentes do STF.

Aliás, é igualmente pacífica a jurisprudência do Tribunal de Justiça de São Paulo, cita-se, para ilustrar, o acórdão dos autos da Apelação Cível nº 1003056-44.2017.8.26.0320, de 01/04/2020:

Violação da ampla defesa e contraditório devidamente caracterizada nos autos. Irrelevância da apreciação de impugnação da multa aplicada pelo Conselho Consultivo, haja vista a necessária preservação do contraditório prévio, a anteceder à própria aplicação da sanção, em ordem a oportunizar-se ao condômino apontado como infrator influir na formação do convencimento do representante legal do condomínio.

Observa-se que o artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal, assegura “aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral […] o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”. Logo, conforme a teoria da eficácia dos direitos fundamentais nas relações privadas, o referido dispositivo constitucional se aplica nas relações entre condomínio e respectivos condôminos.

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